Verdades sobre o bitcoin

Não é incomum a associação de bitcoins com crimes. Isso foi mais frequente no começo de sua história, pois seu uso se popularizou na DeepWeb, na compra de bens e serviços ilícitos e, no final da semana passada, o sequestro que ocorreu em Florianópolis, com resgate pedido em moedas virtuais, reacendeu o debate.

A primeira grande distinção a ser feita é que o bitcoin não é o agente da ilicitude. É apenas uma unidade digital que nasceu para ser um dinheiro virtual, fruto da evolução tecnológica. Os agentes são os compradores e vendedores de bens e serviços ilícitos, os sequestradores de dados e de pessoas.

À primeira vista, suas características parecem favorecer o uso para fins criminosos, supostamente o anonimato e a alta liquidez. Ainda que exista um desafio regulatório para lidar de modo adequado com o uso desta criptomoeda, como já explicado em muitas fontes confiáveis, a transferência de bitcoins (e de outras criptomoedas) não é anônima, as operações de transferência de criptomoedas são sim sujeitas a normas regulatórias e criminais genéricas e, explorando-se mais a fundo, é fácil concluir o oposto, ou seja, que o uso destas unidades digitais para transferência de recursos e dados favorece o controle e o rastreamento deste fluxo.

Há também quem ainda não tenha alcançado que o seu valor não está no seu potencial uso por criminosos, mas sim em como esta unidade digital facilita ou pode facilitar ou otimizar a transferência e armazenagem de recursos, ativos, ou dados em geral. Estamos lidando com uma arquitetura tecnológica elegante e sofisticada, que vem provocando fortes reflexões sobre diversos sistemas e paradigmas estabelecidos com os quais estamos acostumados, e que promete provocar disrupção positiva nos mais diversos setores: bancário, governo, mercado de capitais, imobiliário, saúde, agricultura, cadeias de produção em geral, entre inúmeros outros.

Existe um grande problema em não alcançar níveis mais amplos de compreensão dos conceitos que orbitam o bitcoin. Esse problema é que a compreensão parcial gera confusão, desconfiança e resistência, e não permite acessar plenamente as colocações acima. Em larga escala, gera-se um grande problema econômico e social, na medida em que empresários, técnicos, agentes públicos, tenderão a perceber o assunto como tabu, bloqueando o potencial de inovação de seus próprios negócios e, consequentemente, do nosso País.

O assunto já não é mais de nicho. Pelo contrário, está sendo debatido em todos os fóruns institucionais, mainstream, e se tornando uma questão de cultura geral. Com base em sua inovadora arquitetura tecnológica, todos os dias são descobertos ou percebidos diversos novos potenciais casos de uso. É uma das soluções sendo consideradas para arquitetura de cidades inteiras operando eletronicamente. É um assunto de futuro, sendo construído no presente.

Assim, todos os que se interessem pelo tema, e, em particular, os agentes formadores de opinião, que alcançam milhares de pessoas, precisam buscar informar-se bem, em fontes confiáveis. O bom processo de evolução da nossa sociedade nesse contexto global depende desta compreensão mais plena.

Rosine Kadamani
Advogada especializada em Direito Bancário, com experiência de 13 anos no escritório Pinheiro Neto Advogados. Co-fundadora da Blockchain Academy, escola de formação multi-disciplinar em bitcoin & blockchain, e da OriginalMy, primeira start-up brasileira a utilizar o blockchain como protocolo.