Renato Aragon (*)
“Fazer do limão uma limonada” e “aproveitar as oportunidades geradas pelos problemas” são expressões sempre usadas quando as empresas se deparam com situações difíceis e com poucas possibilidades de reversão. Pois é exatamente neste tipo de posição que o ecossistema fintech pode estar em breve, caso o Banco Central coloque em prática a proposta apresentada na consulta pública referente à harmonização da tarifa de intercâmbio (TIC) das operações de cartões pré-pagos e de débito.
A ideia disposta para avaliação dos interessados é limitar em, no máximo, 0,5% a TIC para transações, tanto feitas com cartões de débito quanto com pré-pagos. Considerando que atualmente essas tarifas variam entre 1,1% e 1,5%, o limite proposto na consulta significará uma redução próxima a 50% numa das principais fontes de receitas das fintechs.
Para assustar ainda mais o ecossistema fintech, essa mudança, caso ocorra, pode chegar justamente num dos piores momentos, já que tanto a conjuntura econômica interna quanto a externa têm reduzido a oferta de investimentos nestas startups.
Sendo assim, ao não conseguirem captar recursos e perderem este volume de receitas, essas empresas emergentes, que reconhecidamente têm sido um dos fatores de maior relevância para alavancar as inovações do setor, teriam que obrigatoriamente colocar o pé no freio e reduzir o ritmo da inovação.
A alternativa para evitar este desfecho é uma velha receita conhecida do empreendedor brasileiro: a criatividade aliada à capacidade de adaptação a novos cenários.
Não por acaso, nos últimos meses já é possível notar uma forte movimentação de mudança de foco nos modelos de negócios das startups financeiras.
Desde que surgiram como um dos mais importantes fenômenos dos últimos anos na indústria financeira nacional, elas têm estruturado sua formação de receitas principalmente no setor de pagamentos, justamente buscando a monetização através de tarifas como a TIC.
Mas antes mesmo da ameaça trazida pela consulta pública, muitos projetos já começaram a buscar alternativas. Afinal, a disseminação do Pix e seus derivados (Pix Cobrança, Pix Saque, Pix Troco, Pix Parcelado e outras modalidades que serão lançadas e patrocinadas pelo BC) já começou a dificultar a formação de renda através de pagamentos.
A primeira opção visualizada parece estar sendo uma migração para o mercado de crédito que oferece oportunidades quer seja na inclusão de desbancarizados, quer seja na simplificação de processos ou no uso intensivo de tecnologia para evolução de análises, entre outros aspectos.
Seja qual for a motivação, a cartilha das estratégias eficientes orienta que qualquer fintech com planos de se lançar no mercado nos próximos meses – ou que já esteja operando –, mas queira desenvolver um projeto financeiramente sustentável para os próximos cinco anos, tenha como definição o fato de que o intercâmbio é apenas uma das fontes de receita.
Afinal, fazer do limão uma limonada e aproveitar as oportunidades geradas pelos problemas são expressões que normalmente sempre são atreladas a uma outra que é: “Nunca coloque os ovos na mesma cesta”.
* Renato Aragon é Associate Director da Xsfera