Regulação e interoperabilidade no Open Finance

  • Paulo Roberto Vigna

Recentemente, durante um evento realizado em Chicago, nos Estados Unidos, o presidente do Banco Central fez uma declaração polêmica sobre o futuro próximo dos serviços bancários no Brasil, a afirmar que em até dois anos os aplicativos de bancos privados não serão mais utilizados. Em seus lugares, teríamos um aplicativo agregador que concederá acesso a todas as contas e informações financeiras de maneira unificada.

Trata-se do Open Finance, tecnologia que operará por meio do compartilhamento de informações financeiras dos clientes, dispensando a necessidade de utilização de aplicativos de diferentes bancos nacionais. Quais são, contudo, as especificidades jurídico-regulatórias que tornam o Open Finance tão revolucionário em comparação com o sistema bancário tradicional?

Um dos mais importantes conceitos ligados ao Open Finance é o de interoperabilidade, que compreende o compartilhamento padronizado de informações entre os participantes de alguns sistemas já existentes no Brasil, como o open insurance (sistema de seguros aberto) e do open banking (sistema financeiro aberto), de maneira segura e célere mediante consentimento expresso e informado dos usuários, que são clientes dos serviços e titulares dos referidos dados.

Com o compartilhamento de dados em regime de interoperabilidade, os processos em ambientes fortemente regulados, tais como mercado financeiro, de capitais, securitário, de previdência, de câmbio e de capitalização, se entrelaçam de forma integrada e harmônica. As assimetrias informacionais são sensivelmente reduzidas com uma vasta gama de vantagens aos envolvidos: clientes, prestadores de serviços e entes reguladores dos sistemas. Quando disponibilizados e utilizados em regime de interoperação, todos são grandemente beneficiados.

A interoperabilidade se encontra regulamentada na Resolução Conjunta CMN/CNSP nº 5 de 20/05/2022, e artigo segundo, inciso II, define as suas infraestruturas de suporte como os serviços disponibilizados aos integrantes dos sistemas, e que se encontram relacionados ao diretório de participantes, ao service desk, às plataformas de resolução de disputas, e por fim, ao ambiente de testes de Application Programming Interfaces (APIs).

O artigo 3 da Resolução Conjunta traz ainda alguns deveres para os participantes do Open Finance, como por exemplo, a necessidade de criação de estruturas de governança com vistas a propor e implementar padrões técnicos e procedimentos operacionais que assegurem a interoperabilidade dos sistemas envolvidos. No mesmo sentido, temos o estabelecimento de ambientes de discussão e de deliberação conjunta para a implementação e gestão da infraestrutura de suporte necessária à indispensável interoperabilidade.

A expansão do Open Finance traz diversas vantagens para o mercado bancário e para o sistema financeiro, como por exemplo, o estímulo ao aumento da variedade dos produtos e a eficiência dos serviços disponibilizados aos clientes e interessados. Em especial para os usuários-consumidores, que passam a ter maior controle sobre seus dados bancários e histórico financeiro, e assim podem receber acesso a melhores serviços.

Um benefício sistêmico e amplo do Open Finance pode ser apontado na bancarização de parcelas significativas da população que se encontra fora do sistema bancário nacional e movimenta quantias significativas de recursos em dinheiro em espécie. O maior acesso a produtos financeiros por parte dessas pessoas, favorece também as diversas fintechs que atuam neste segmento e as próprias instituições bancárias.

Cabe salientar que o compartilhamento de dados no âmbito do Open Finance deve observar, obrigatoriamente, os parâmetros da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que traz regras sobre o consentimento dos titulares dos dados pessoais.

Nesta direção, a Resolução Conjunta nº 1, de 4 de maio de 2020, expedida pelo Banco Central e pelo Conselho Monetário Nacional, veicula diversas regras sobre proteção de dados, com destaque para seu artigo 2, inciso VII, que define consentimento como a manifestação livre, informada, prévia e inequívoca de vontade, feita por meio eletrônico, pela qual o cliente concorda com o compartilhamento de dados ou serviços para finalidades determinadas.

É relevante destacarmos que existem exceções restritivas para os dados pessoais conhecidos como sensíveis, os quais envolvem pontuações de crédito e informações necessárias a autenticação dos clientes.

A estrutura da agenda tecnológica do Banco Central tem trazido inovações digitais que tem revolucionado as relações entre a população, as instituições financeiras e os demais integrantes do mercado, a exemplo do PIX, do Real Digital-DREX, e do Open Finance. A segurança nos processos e procedimentos on line, a economia e a agilidade trazidas por estas inovações têm trazido grandes benefícios a sociedade e os negócios, e se torna cada vez mais importante o papel do advogado neste cenário desafiador.

  • Paulo Roberto Vigna é advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária.